colunista

Elias Fragoso

Economista, foi prof. da UFAL, Católica/BSB, Cesmac, Araguaia/GYN e Secret. de Finanças, Planej. Urbano/MCZ e Planej. do M. da. Agricultura/DF e, organizador do livro Rasgando a Cortina de Silêncios.

Conteúdo Opinativo

Os (diversos) números da corrupção na saúde

20/05/2020 - 09:05
Atualização: 20/05/2020 - 09:13

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No Brasil, a corrupção é endêmica. Entra governo, sai governo e ela lá, firme e forte, a corroer os recursos da Nação e a corromper autoridades desde os mais baixos até os de mais altos escalões. Em alguns casos, como durante os governos petistas, ela “sai dos trilhos” e provoca o tsunami econômico e social que ainda estaríamos a vivenciar, não fosse a irrupção da pandemia do Coronavírus, que piorou ainda mais o que já era caótico.

Agora, se existe uma área onde a corrupção, sem trocadilhos, é epidêmica, esta área é a da saúde. Verdadeiras quadrilhas organizadas atuam naquela pasta há dezenas de anos, ao ponto de certas áreas por onde a grana ou os processos que levam a ela, terem “donos” que corrompem pelos meios conhecidos e findam levando todas as licitações – as raras limpas e todas as que foram objeto de corrupção de agentes públicos.

Ontem, o jornal O Estado de São Paulo publicou matéria com o presidente do Instituto Ética e Saúde, economista Eduardo Winston da Silva, em que afirma (de forma conservadora, segundo o mesmo) que 2,3% do que é destinado à saúde neste país é desviado. São nada menos que 14,5 bilhões de reais a cada ano. Ainda bem que ele fez a ressalva de que sua ótica é a conservadora, porque não enxergo neste número qualquer verossimilhança com a realidade factual da saúde.

Para chegar aos 2,3%, o Instituto tomou como referência dados da transparência internacional onde o Brasil é o 106º em 180 países pesquisados, com 35 pontos. E comparou esses dados aos do Reino Unido, que ocupa a 12ª posição no mesmo ranking com 77 pontos. E relativizando a perspectiva indicou que a corrupção na saúde brasileira é 2,2 vezes maior que a daquela federação de países.

Há de pronto que se cuidar de analisar os aspectos metodológicos do achado, vez que o índice da Transparência Internacional avalia a percepção da corrupção por países e não por setores a partir de entrevistas opinativas de executivos e empresas de todo o mundo, o que pode nos dar uma ideia apenas aproximativa da realidade. Até porque a discussão sobre o melhor parâmetro para avaliar a corrupção de um país ainda não foi encontrado, dada a dificuldade em se obter este tipo de informação.

Além disso, sem entrar no mérito, entendemos que a comparação com o Reino Unido nos deixa bem na fita. Sob qualquer métrica, o país anglo-saxão é visto como um país de baixo nível de corrupção e com um serviço de saúde pública que pode ser considerado um dos melhores do mundo. E o Brasil, definitivamente não está nessa escala. Em termos de corrupção estamos mais para países africanos, que para a Europa cosmopolita e desenvolvida. 

Por outro lado, estudo realizado pelo Departamento de Competitividade e Tecnologia da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) de 2016 apresenta números bastante superiores aos do Instituto Ética e Saúde: a corrupção no SUS alcançava 20 bilhões de reais naquele ano (ou 23,6 bilhões em valores atualizados). Como o Orçamento da União para 2020 contempla 126,5 bilhões de reais para a saúde (que equivalem a 45% dos recursos do SUS), enquanto Estados e municípios aportarão outros 154,6 bilhões de reais (ou 55% do Orçamento Geral da Saúde), totalizando 281,1 bilhões de reais e considerando os dados da Fiesp de que 8,4% dos recursos irão escoar pelo ralo da corrupção, significa dizer que 23,6 bilhões de reais serão roubados da saúde dos brasileiros. 

Para se entender melhor esse número, ele equivale a 2,3 vezes o Orçamento do Estado de Alagoas para 2020! A velha cantilena do setor de que é subfinanciado, cai por terra quando se observa o tamanho do rombo causado pela corrupção. É preciso antes de pedir mais recursos, combater por dentro esse mal para que os recursos cheguem na ponta.

Existem inúmeros estudos disponíveis que aprofundam o tema e apresentam alternativas senão para zerar, mas ao menos reduzir substancialmente o tamanho do gigantesco problema da corrupção, na saúde e, por tabela no país. Mas pelo que se viu nos últimos dias, parece estarmos caminhando no sentido inverso. Indo na contramão da humanidade no combate ao Coronavírus e promovendo um liberou geral para o aumento da nossa endêmica corrupção. 

A entrada do Centrão no governo federal e o decreto que isenta de responsabilidades agentes públicos por atos  durante a epidemia, não passa disso. Corrupção deslavada. E aí, como fica o presidente que prometia combate ferrenho a essas coisas?

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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