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Mutum das Alagoas

21/10/2019 - 15:04

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De tanto ler e ouvir sobre a crise ética da política brasileira, às vezes a gente fica cansado do tema. A cada semana, a cada dia, tomamos conhecimento de novas operações da Polícia Federal na caça a políticos e a empresários, lavagem de dinheiro, prisões de criminosos do colarinho branco, “laranjas”, buscas e apreensões em endereços antes considerados invioláveis. 

Estava eu nessa “ressaca” de notícias ruins quando recebi telefonema da amiga Dra. Adriana Alves, advogada comprometida com as coisas do meio ambiente. A princípio queria ela saber notícias, pois passamos meses sem nos vermos ou falarmos. De repente, como por inspiração oportuna, diz-me ela, com genuíno entusiasmo, sobre a reinserção do Mutum nas florestas alagoanas. 

Durante vários minutos estende-se em explicações orgulhosas sobre esse ato de generosidade para com a natureza, instruindo-me sobre ações nesse sentido empreendidas pelo meu amigo e vizinho Fernando Pinto, pelo promotor de Justiça Alberto Fonseca, e por outros abnegados d’alhures, como Pedro Nardeli, Roberto Azeredo, para citar apenas alguns. 

A importância desse trabalho, observou, passa despercebida da sociedade. É um marco, porém, para Alagoas, sem interferência de governos e políticos. Somos o primeiro estado a reintroduzir uma espécie de animal já extinta – no caso, de uma ave – na natureza. A grandeza da ação dessas pessoas é muito maior quando a fazem sem estardalhaços, sem apelos publicitários, sem a pretensão de louros políticos. O que os move é nada menos que o interesse em contribuir para o refazimento da natureza, tão desprezada e maltratada. É lição oportuna, quando a mídia nacional nos informa amiúde sobre os ataques, públicos e privados, contra a Amazônia.

Instigado pela Dra. Adriana, vou em busca de informações sobre o pássaro, e tomo conhecimento de que o Mutum – um ou dois exemplares da espécie – apenas resistia em cativeiro, e após período de readaptação, pelas mãos daqueles abnegado retorna à nossa Mata Atlântica, ela mesma tão degradada, seja pelo desmatamento desordenado, ou pela poluição das águas, do ar e do solo. 

Assim como o uso do cachimbo deixa torta a boca, inevitavelmente ao pensar no Mutum das Alagoas reflito sobre o quão seria bom que os nossos políticos fossem restaurados na decência e na ética, sendo então reintroduzidos na vida pública. A comparação é má, porquanto o Mutum, além de nenhum mal praticar, foi extinto na natureza pela ação depredatória dos seres humanos. No caso da política, os seus atores, são eles os próprios depredadores da sociedade, e resistem à extinção, apesar dos esforços da Lava Jato, hoje um símbolo nacional.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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