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Alari Romariz

Alari Romariz atuou por vários anos no Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa de Alagoas e ganhou notoriedade ao denunciar esquemas de corrupção na folha de pagamento da casa em 1986

Conteúdo Opinativo

Maceió dos meus amores

13/06/2022 - 14:02

ACESSIBILIDADE


Em 1950, fomos morar na Avenida Fernandes Lima, no Farol. Era um bairro aconchegante, cheio de ruas arborizadas, boas casas, trilho do bonde de um lado no barro e o outro lado asfaltado. Foram anos felizes, com certa liberdade.

Meu pai procurava fazer amizade com o condutor e o fiscal do bonde, para que fôssemos bem tratados. Éramos quatro irmãos indo para a Rua do Sol, onde ficava o Grupo Escolar. O resultado de tanta atenção era descermos em frente à escola, apesar de o ponto de parada ficar bem antes. Dizia o Sr. Lira: “Cuidado, meninos”!
O Convento dos Capuchinhos era um ponto de referência para nós, crianças e adolescentes do bairro. Os meninos jogavam futebol, eram coordenados pelo frei Cassiano que, vez em quando, almoçava na nossa casa. As meninas jogavam voleibol e eram dirigidas pelo frei Egídio, sábio e culto homem. Aprendemos muito com eles, frades, filhos de Deus.

No fim do ano, as festas natalinas culminavam com o Pastoril, que ia até o começo de janeiro. O local do evento era o auditório do próprio convento.

Em 1952, os bondes deixaram de circular e surgiram os ônibus, desempenhando semelhante papel. Íamos ao colégio neles e conhecíamos amigos de escolas diferentes. Havia certo preconceito com os estudantes de colégios públicos, mas não nos incomodávamos com tal fato, pois orgulhávamo-nos de estudar no Instituto de Educação.

Repito sempre em meus artigos a excelência do ensino público naquela época. Os professores eram catedráticos e selecionados através provas e defesa de tese. O exame de admissão para o Liceu Alagoano e o Instituto de Educação era um pequeno vestibular. Preparávamo-nos o ano todo para prestar o tal concurso.

Infelizmente, houve um processo de queda no ensino público em Alagoas e na fase dos meus filhos não valia a pena estudar nos colégios municipais e estaduais. Não sei exatamente o que aconteceu, mas atribuo a culpa aos governantes que deixaram o ensino público piorar consideravelmente.

De 1955 para frente, já com 14, 15 anos, entrei na adolescência, ainda morando no Farol. Anos felizes, cheios de amigos, encontros na Feirinha da Santa Rita e na festa da Igreja da mesma santa. Meu pai era adepto da liberdade vigiada e tínhamos hora para chegar em casa. Dia seguinte, procurava conversar conosco, saber das novidades e com quem nos encontrávamos. Homem inteligente.

Em 1956, fiz 15 anos e minha vida mudou. Comecei a namorar um alagoano que estudava no Ceará. Passava o ano esperando chegar dezembro para curtir o amor e as festas. A fidelidade extrema ao namorado era uma característica da jovem estudante, que ficou cinco anos vivendo de forma diferente: cinema e praia com as amigas. Nada de festa ou flerte com outros rapazes. Quando conto essa história para meus netos, eles riem e dizem: “Isso não existe mais, vovó”!

Lembro-me quando a Avenida Fernandes Lima foi asfaltada do lado direito até o quartel do 20° BC. Vieram engenheiros de São Paulo e as ruas laterais foram abertas. Mudou tudo e o Farol passou a ser um bairro mais barulhento com a vinda do progresso. Andar de bicicleta pelas ruas ficou complicado.

Em 1957, o Instituto de Educação e outros colégios públicos foram reunidos no famoso CEPA. Nosso pai vendeu a casa e fomos morar no centro da cidade. Tomar ônibus para ir à escola era difícil. Saía de casa às 12 horas, com duas irmãs menores e só chegávamos no ponto final às 13 horas. O diretor do Instituto conseguiu com as empresas que os ônibus entrassem no CEPA.

No local da nova morada, a vida era mais animada, fazíamos tudo a pé, mas as lembranças do Farol eram fortes demais. Jogar bola, andar de bicicleta era impossível.

Tentei dar aos meus filhos uma infância e uma adolescência felizes, para que pudessem contar aos meus netos os bons momentos vividos. Acho que consegui.

Atualmente, os tempos são outros, cheios de violência, de competições, de políticas desarrumadas. Só Deus para nos salvar.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do EXTRA


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